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NOVO MARCO regulatório do Inmetro: utopia ou distopia estatal?

Novo marco regulatório do Inmetro: utopia ou distopia estatal?

Segundo a instituição, o novo modelo regulatório do Inmetro irá modificar a forma de como serão as suas regras, como irá exercer o monitoramento e induzir à mudança de comportamento dos agentes regulados. A ideia será alinhar o país às melhores práticas internacionais na regulação de produtos, mudar o conjunto de atos normativos, processos, atividades e práticas institucionais, assim como à forma como os agentes vinculados à regulação se organizam e interagem, para perseguir os objetivos regulatórios. Para o Inmetro, esses objetivos compreendem a promoção da segurança; a proteção da vida humana, vegetal e animal; a proteção do meio ambiente; e a prevenção de práticas enganosas de comércio. Contudo, isso pode ser uma utopia que significa um mundo irreal, um universo paralelo, inimaginável, lugar fictício. Basicamente, um mundo que nunca irá existir, pois é um mundo perfeito. Ou será uma distopia que é o contrário de utopia. Ou seja, ela significa um universo autoritário controlado pelo Estado, o qual explora a classe dos empresários e os consumidores, etc., tornando as relações em condições precárias. Nesse mundo os problemas são camuflados, fingindo uma perfeição de sistema, o que resulta em uma estupidez coletiva. A conclusão será dos leitores e dos usuários do sistema Inmetro que até hoje não funcionou de maneira plena a fim de atender à sociedade brasileira em termos de competitividade.

Antes de escrever sobre o novo, deve-se entender o que é a chamada regulação ou modelo regulatório. Trata-se de uma forma de ação de controle do Estado que envolve um conjunto de instrumentos jurídicos (leis, decretos, regulamentos) que estabelecem obrigações a serem ser cumpridas por agentes privados. A regulação é, portanto, uma forma pela qual o Estado, por meio de entidades e órgãos normativos, assegura o cumprimento dos objetivos regulatórios.

No âmbito do Inmetro, por exemplo, refere-se a regulamentos que obrigam os fabricantes e importadores a atenderem determinados requisitos técnicos, para que os produtos que disponibilizam no mercado não coloquem em risco a saúde e a segurança dos consumidores. Além da criação da regra, a regulação envolve ainda duas importantes etapas: o monitoramento do cumprimento das regras e a aplicação de um conjunto amplo de ações regulatórias, tais como ações de limitação, fiscalização e repressão, a fim de induzir que os particulares as cumpram.

Sendo assim, o modelo regulatório refere-se ao conjunto de atos normativos, processos, atividades e práticas institucionais, assim como à forma como os agentes vinculados à regulação se organizam e interagem, para alcançar os objetivos regulatórios. Conforme destaca Gustavo Kuster, diretor de Avaliação da Conformidade do Inmetro, atualmente, o Inmetro trabalha com um arcabouço que regula 684 itens, nos campos da avaliação da conformidade e da metrologia legal. Todo esse emaranhado de regras cobre apenas 10% dos produtos comercializados no Brasil.

“Precisamos nos modernizar em relação às regras atuais. A ideia do novo arcabouço normativo é criar princípios básicos e gerais que regulem o mercado em relação à segurança e ao desempenho dos produtos e serviços de uma forma geral e em sintonia com as melhores práticas regulatórias. Nosso objetivo é cobrir 100% do que é comercializado no mercado nacional”, explica Kuster.

“Enxugar a burocracia”, acrescenta Gustavo Kuster, “tem como objetivo incentivar a competitividade entre os produtos comercializados e fabricados no Brasil ou importados no mercado brasileiro. Para isso, há a necessidade de uma regulação mais simples e menos prescritiva, que permita a inovação por parte do setor produtivo”.

De acordo com Kuster, as vantagens do novo marco regulatório do Inmetro são muitas, como a convergência regulatória com modelos de outros países da Comunidade Europeia e dos Estados Unidos; previsibilidade para o setor produtivo, que conhecerá os riscos que seus produtos e serviços não poderão gerar no mercado; confiança da sociedade que, por meio de um ambiente normativo mais moderno, terá todo o mercado de produtos de consumo regulado; facilitação das trocas comerciais, entre outras.

Deve-se ressaltar que o atual modelo regulatório foi realizado para responder à questão sobre o quanto este formato contribuiu para a consecução dos objetivos finalísticos do Inmetro, no que tange às atividades regulatórias, e o quanto do resultado do modelo atual é explicado por suas próprias características. Os objetivos do Inmetro foram determinados a partir do artigo 3º da Lei nº 9.933, de 1999, como sendo a promoção da segurança, a proteção da vida e da saúde humana, animal e vegetal e do meio ambiente e a prevenção de práticas enganosas de comércio na sua área de competência legal.

A performance regulatória, ou seja, o custo da efetividade do cumprimento dos objetivos pelo modelo regulatório atual, não pôde ser avaliada diretamente. Assim, foram utilizados três indicadores – focalização, cobertura e compliance – que, de forma indireta, serviram ao propósito de avaliar a efetividade do modelo regulatório corrente.

Respectivamente, os indicadores traduzem o quanto as ações regulatórias são direcionadas para a resolução de problemas regulatórios concretos, o quanto dos objetos do escopo regulatório do Inmetro é atualmente regulado e qual o nível de conformidade dos agentes regulados. Os resultados da avaliação desses indicadores mostram um desalinhamento entre os objetivos finalísticos do Inmetro no campo regulatório e o modelo atualmente em vigor.

Inicialmente, verifica-se a baixa focalização do modelo vigente, fruto dos seguintes fatores: concorrência do papel regulatório com o papel de provedor de esquemas de avaliação da conformidade para outros regulamentadores, traduzida por um estoque regulatório composto por 60% de itens de competência legal do Inmetro; ausência de um sistema de monitoramento de problemas regulatórios robusto; e uso massivo da fiscalização formal.

Em sequência, apesar do grande esforço de ampliação do número de objetos regulamentados com conformidade avaliada, constatou-se a baixa cobertura regulatória, estimada em apenas 12% do escopo de competência legal do Inmetro. Por fim, o índice de conformidade se situa em torno de 60%, a despeito do alto grau de prescrição de regras e do uso intensivo de esquemas de avaliação da conformidade compulsórios.

A regulamentação específica (por objeto), prescritiva, associada quase que exclusivamente à avaliação da conformidade, a gestão dos esquemas de avaliação da conformidade centralizada no Inmetro e o excessivo controle pré-mercado têm por corolário a baixa eficiência operacional e de alocação de recursos, o que explica o baixo alcance da regulação. Os recursos disponíveis para a diretoria foram praticamente consumidos com a manutenção das atividades do modelo atual, tirando o foco da principal atividade de um regulamentador, que é a identificação e resolução de problemas regulatórios.

Tudo isso em um contexto em que os recursos estão cada vez mais escassos, especialmente os humanos e orçamentários. Adicionalmente, o modelo vigente criou um ambiente regulatório de desestímulo à inovação, à competitividade e ao acesso a outros mercados em função do desalinhamento com outros modelos regulatórios mais robustos, descritos a seguir.

Quando se compara o modelo regulatório atual com as melhores práticas internacionais de regulação de produtos de consumo, notadamente as da União Europeia e dos Estados Unidos da América, percebem-se algumas diferenças notórias. Esses modelos são caracterizados por uma regulação baseada em riscos, com regulamentos gerais que especificam os objetivos a serem perseguidos (por exemplo, não expor os consumidores a riscos), focando as atividades regulatórias no monitoramento de problemas regulatórios, sendo as ações regulatórias formuladas e priorizadas a partir desse monitoramento.

As especificações técnicas pormenorizadas de cada objeto para fins de cumprimento dos requisitos gerais expressos nos regulamentos ficam a cargo dos organismos de normalização. Com isso, tem-se um modelo mais eficiente e flexível para lidar com e priorizar os problemas regulatórios de maior relevância.

Tomando essas práticas como inspiração e tendo como norte a resolução dos problemas do modelo atual, concebeu-se a proposta de um novo modelo regulatório, sustentado por três pilares e um princípio geral. Os pilares são: um ambiente normativo baseado em regulamentos gerais e requisitos essenciais, visando ao aumento da cobertura do escopo legal e à diminuição de regras prescritivas; o foco na resolução dos problemas regulatórios para a ampliação da focalização da atividade regulatória; e o aumento da responsabilização dos fornecedores com o propósito de ampliar o nível de compliance dos agentes regulados. O princípio da flexibilidade, que é a base do modelo e permeia os três pilares, se relaciona à ideia de eficiência e proporcionalidade das ações regulatórias.

Segundo um ex-funcionário do Inmetro, que prefere manter o anonimato, o modelo normativo no Brasil é um monopólio, com apenas um organismo de normalização que possui os direitos de tradução e desenvolvimento das normas técnicas. Nos USA, a The American National Standards Institute (ANSI) é uma organização privada, sem fins lucrativos, dedicada a apoiar as normas técnicas dos USA, o sistema de avaliação de conformidade e a fortalecer seu impacto, tanto nacional quanto internacionalmente.

Seja em casa ou no exterior, a ANSI está comprometida em melhorar a competitividade global dos negócios e na qualidade de vida dos USA, fornecendo uma estrutura para o desenvolvimento de normas justas e sistemas de avaliação da conformidade da qualidade, além de proteger sua integridade. Abrangendo praticamente todos os setores, representa os diversos interesses de mais de 270.000 empresas e organizações e 30 milhões de profissionais em todo o mundo. Existem cerca de 10.500 normas nacionais americanas que foram desenvolvidas e aprovadas de acordo com os requisitos essenciais da ANSI.

Atualmente, existem mais de 230 desenvolvedores de normas credenciados pela ANSI, incluindo organizações como ASTM International, Underwriters Laboratories, Inc., NFPA International, ASME International, ASHRAE, CSA America, Inc. e NSF International. A acreditação garante a aderência aos princípios fundamentais da ANSI. Os desenvolvedores de normas credenciados pela ANSI desenvolvem as normas nacionais americanas em muitas áreas diferentes e a ANSI fornece aos desenvolvedores os procedimentos e os serviços de gerenciamento eficazes para garantir o uso eficiente de seu tempo e recursos financeiros e promove o desenvolvimento oportuno dos documentos.

A ANSI, em cooperação com esses desenvolvedores, identifica a necessidade de uma delas, define prioridades para sua conclusão e garante que todas as partes interessadas impactadas tenham a oportunidade de participar. As auditorias supervisionam a integridade do processo ANSI, assegurando regularmente a aderência aos procedimentos ANSI e salvaguardando o valor da designação ANS.

As normas nacionais norte-americanas fornecem dimensões, classificações, terminologia e símbolos, métodos de ensaios e requisitos de desempenho e segurança para o pessoal, produtos, sistemas e serviços em centenas de setores. Muitas dessas normas deixam claro como melhorar a segurança dos produtos para a proteção dos consumidores, incluindo produtos como berços, capacetes de bicicleta, eletrodomésticos, cortadores de grama, escadas, etc.

Conforme relata Reinaldo Balbino de Figueiredo, diretor de credenciamento de organismos de certificação da ANSI/USA e membro da Academia Brasileira da Qualidade (ABQ), deve-se levar em consideração que os mais de 230 organismos de normalização nos USA, acreditados pela ANSI, atuam em diferentes áreas e publicam suas normas que podem ser normas American National Standards (ANS) ou não. Para serem normas ANS os organismos de normalização elaboraram as normas seguindo o processo que segue o ANSI Essential Requirements. O número de ANS standards estão por volta de mais de 13.000. Normas que são elaboradas pelos organismos de normalização que não são ANS chegam a mais de 100.000.

No Brasil, há aproximadamente 8.000 normas, muitas deles precisando de revisão ou atualização. A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) é o organismo de normalização no Brasil, uma sociedade civil sem fins lucrativos, que exerce função delegada do Estado por intermédio do Conmetro/Sinmetro, órgãos do Ministério da Economia.

Em 21 de novembro de 1962, por meio da lei de número 4.150, foi declarada de utilidade pública, e em 1992 por Resolução n.º 07 do Conmetro foi reconhecida como o único Fórum Nacional de Normalização, publicada no DOU de 24.08.1992. Esta resolução tornou público o Termo de Compromisso realizado entre o governo brasileiro e a ABNT, que atribui a ela a missão de coordenar, orientar e supervisionar o processo de elaboração de normas brasileiras. Assim, a ABNT adquiriu o status jurídico de agente do Estado ou melhor de agência de normalização brasileira.

Deve-se repetir, à exaustão, que a normalização tem um papel preponderante no desenvolvimento de um país, por objetivar reduzir a crescente variedade de procedimentos, eliminando o desperdício e o retrabalho, facilitando a troca de informações entre fornecedor e consumidor, especificando critérios de aferição do desempenho de produto ou serviço, amparando a vida e a saúde; fixando padrões de qualidade e segurança que regem a produtividade e o desenvolvimento tecnológico. As normas brasileiras (NBR) exercem uma função social essencial e relevante no Estado, pois, se for aplicada as normas pertinentes, pode-se assegurar que os produtos ou serviços são compatíveis com aqueles fabricados ou fornecidos por outros. Essa é uma das mais efetivas formas de ampliar o mercado, em particular o de exportação.

Tanto os regulamentos técnicos como as normas técnicas são obrigatórios, quando se trata do desenvolvimento nacional e à proteção de direitos fundamentais tais como os direitos relativos à vida, à saúde, à segurança, ao meio ambiente, etc. Isso pode auxiliar as empresas no cumprimento das suas obrigações legais relativas a determinados assuntos como segurança do produto e proteção ambiental. Haverá impossibilidade de vender os produtos em alguns mercados a menos que estes atendam certos critérios de qualidade e segurança. Estar em conformidade com normas pode poupar tempo, esforço e despesas, dando a tranquilidade de estar de acordo com as responsabilidades legais.

Incluir normas como parte de sua estratégia de marketing, pode conferir a seu produto uma enorme chance de sucesso. Isto porque – através de sua natureza colaborativa – a normalização pode auxiliar na construção do conhecimento das necessidades de mercado e dos consumidores. Iniciativas de negócios em mercados que utilizam normas reconhecidas possuem maiores chances de sucesso.

O processo de avaliação de riscos possibilita um entendimento dos riscos, suas causas, consequências e probabilidades. Isso proporciona uma entrada para decisões sobre: se convém que uma atividade seja realizada; como maximizar as oportunidades; se os riscos necessitam ser tratados; a escolha entre opções com diferentes riscos; a priorização das opções de tratamento de riscos; a seleção mais apropriada de estratégias de tratamento de riscos que trará riscos adversos a um nível tolerável.

Completado um processo de avaliação de riscos, o tratamento de riscos envolve selecionar e acordar uma ou mais opções pertinentes para alterar a probabilidade de ocorrência, o efeito dos riscos, ou ambos, e a implementação destas opções. Isso é acompanhado por um processo cíclico de reavaliação do novo nível de risco, tendo em vista a determinação de sua tolerabilidade em relação aos critérios previamente definidos, a fim de decidir se tratamento adicional é requerido.

Na gestão de risco, a priorização dos riscos por perda (ou impacto) e sua probabilidade de ocorrência devem ser tratados em primeiro lugar dentro de um determinado contexto definido pela organização. A gestão de risco deve identificar riscos intangíveis que são ignorados pelas organizações devido à falta capacidade de entendimento do risco. Muitas vezes, a existência do risco é decorrente de vários fatores que não são correlacionados pela organização e, desta forma, não identificados.

Para complicar o sentido da utopia ou distopia, o governo fala em Análise de Impacto Regulatório (AIR) que pode ser definida como um processo sistemático de análise baseado em evidências que busca avaliar, a partir da definição de um problema regulatório, os possíveis impactos das alternativas de ação disponíveis para o alcance dos objetivos pretendidos, tendo como finalidade orientar e subsidiar a tomada de decisão. Como ferramenta de melhoria da qualidade regulatória, proporciona maior fundamentação técnica e analítica ao ente regulador no momento da sua tomada de decisão, especialmente quando esta significa a imposição de regras a serem cumpridas.

A regulação é o instrumento por meio do qual o Estado intervém no comportamento dos agentes, de modo a promover aumento da eficiência, de segurança, crescimento econômico e ganhos de bem-estar social. Entretanto, se utilizada de modo arbitrário e desproporcional, pode gerar efeitos nocivos substanciais aos mercados e à sociedade como um todo, tais como: aumento do preço dos produtos ou serviços, queda de investimentos, barreiras à entrada, barreiras à inovação, altos custos de conformidade ao setor regulado, aumento dos riscos e distorções de mercado.

Além disso, a regulação também impõe custos de fiscalização e monitoramento ao regulador. Assim, ela só deve ser criada quando sua existência é justificada. No Brasil, em que pese a existência de diversas agências reguladoras destinadas a setores específicos, diversos outros órgãos e entidades desempenham atividades regulatórias como, por exemplo, o Banco Central (Bacen), Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Superintendência de Seguros Privados (Susep), etc.

A administração direta historicamente também exerce função regulatória por meio de seus atos. Por exemplo: aumento e redução da alíquota do IOF para intervir na compra e venda de moeda estrangeira (Receita Federal), regulação do nível de depósito compulsório das instituições financeiras para aumentar ou reduzir a quantidade de moeda em circulação (Bacen); regulação sobre a quantidade, qualidade e regras de financiamento à educação superior com o objetivo de ampliar a oferta ou o acesso a esse serviço (Ministério da Educação); regulação para produção e comercialização de produtos de origem animal e de bebidas e produtos de origem vegetal (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).

A experiência internacional demonstra que o diálogo e a consulta a atores externos são fundamentais para uma AIR de qualidade. Quando conduzidos de modo adequado, os processos de participação social não só reduzem a assimetria de informação, como embasam e legitimam a tomada de decisão.

A realização de consultas e audiências públicas já é prática comum entre as agências reguladoras federais, que seguem os ritos e procedimentos definidos em lei ou outros normativos próprios sobre o tema, e entre alguns órgãos e entidades da administração direta. Entretanto, geralmente esses processos são realizados após já tomada a decisão sobre o tipo de ação a ser implementada, buscando colher contribuições e manifestações sobre a minuta do instrumento de intervenção já elaborado.

A boa prática regulatória recomenda que a consulta e o diálogo com os interessados no problema regulatório devem começar o mais cedo possível, ainda nos estágios iniciais da AIR. O objetivo é convidar os atores relevantes a contribuir para melhorar a qualidade da análise que orientará a decisão. Quando envolvidos após já tomada a decisão, a tendência é que estes atores só se debrucem sobre a minuta apresentada, questionando seus dispositivos sem considerar o processo de análise que culminou em sua proposição, mesmo que a AIR seja disponibilizada para consulta junto com o instrumento.

Voltando à ideia do Inmetro: proporcionar maior flexibilidade no uso das ferramentas regulatórias. O primeiro grupo de regras é formado por três níveis de regulamentos. No primeiro nível está o regulamento geral, que ampliará a cobertura regulatória e permitirá maior capacidade de resposta pelo regulador.

No segundo nível, temos os regulamentos transversais, que podem cobrir tipos de riscos (químicos, mecânicos, elétricos, etc.) ou um conjunto de objetos (por exemplo, produtos infantis). No terceiro e último nível estão os regulamentos específicos para cada objeto. A ideia do novo ambiente normativo é que, como a ação regulatória não depende mais da elaboração de regulamentos técnicos específicos para cada objeto, a priori, esses só seriam elaborados quando os demais níveis não forem suficientes para resolução de um problema.

O foco na resolução de problemas regulatórios envolve, em primeiro lugar, a construção de uma estratégia de monitoramento de problemas regulatórios robusto, com aprimoramento das ferramentas de monitoramento atuais e introdução de novas. O ideal é a combinação de sistemas de monitoramento passivos com sistemas ativos para contemplar o maior número possível de objetos e aspectos monitorados. O segundo aspecto desse pilar é a mudança do processo regulatório, que terá como fluxo principal não mais o processo de regulamentação, mas sim, de detecção de problemas regulatórios seguido da aplicação, do monitoramento e da avaliação das ações regulatórias direcionadas para resolução desses problemas.

O aumento da responsabilização do fornecedor passa por uma maior disposição do Inmetro na aplicação das ações necessárias para induzir a mudança de comportamento, mas não só isso. Passa também por explicitar nos regulamentos que a responsabilidade pela resolução dos problemas regulatórios é do próprio fornecedor, pela ampliação dos instrumentos de execução disponíveis e pela adoção de um novo modelo fiscalização, o qual deve partir de abordagens de persuasão para, de acordo com o comportamento do ente regulado, ampliar o uso de medidas coercitivas. Há também a necessidade da maior presença da fiscalização em zonas alfandegadas, bem como em fábricas e centrais de distribuição.

O princípio geral da flexibilidade perpassa todos os pilares e está associado à ideia de eficiência e proporcionalidade das ações regulatórias. As ações empregadas devem ser aquelas estritamente necessárias para a resolução dos problemas regulatórios e os recursos devem estar disponíveis, na medida do possível, para serem alocados de forma a maximizar o resultado da regulação.

Em termos concretos, há duas linhas de flexibilização a serem perseguidas, sendo a primeira a ampliação do leque de ferramentas regulatórias, tal como o uso de estratégias modernas de regulação, como as de intuições comportamentais, assim como a introdução de novos arranjos institucionais para avaliação da conformidade. A segunda linha da flexibilização é a desvinculação administrativa, ou seja, a liberação de determinadas obrigações estabelecidas para o Inmetro em atos administrativos ou em normas do sistema de gestão da qualidade para que os recursos possam ser alocados de forma mais eficiente a cada ciclo de planejamento das ações regulatórias.

Por fim, entre as questões pendentes estão a necessidade de realizar uma avaliação de riscos e formular estratégias de mitigação; a elaboração de um plano de implementação e transição; a proposta de novos processos e de nova estrutura organizacional; e a definição dos recursos necessários para o funcionamento do novo modelo. Segundo o Inmetro, a normalização, aliás, é um ponto que merece destaque no ambiente regulatório da União Europeia (EU).

As normas europeias exercem uma importante função no mercado interno, graças à utilização das normas harmonizadas na presunção da conformidade dos produtos com os requisitos essenciais estabelecidos na legislação. Isso quer dizer que o cumprimento das normas harmonizadas confere a presunção de conformidade com os requisitos essenciais. Em optando por não utilizar as normas harmonizadas, o fabricante não se beneficia da presunção de conformidade.

Cabe ressaltar que atender à norma não é necessário nem suficiente. De qualquer, forma o fornecedor ainda fica obrigado a realizar a análise de risco do seu produto para evitar que consumidores ou o meio ambiente sejam prejudicados por questões não previstas no regulamento, sejam elas advindas da inovação trazida aos produtos ou da combinação de características de diversos produtos em um só. Um exemplo disso pode ser um brinquedo que possua bateria interna, porta de carregamento e conexão à internet, como deve ser cada vez mais comum com a popularização da internet das coisas. Esse produto teria que atender simultaneamente aos regulamentos de segurança dos brinquedos, compatibilidade eletromagnética, equipamentos de rádio e dispositivos elétricos de baixa tensão.

Por fim, argumenta o Inmetro, fica claro que nesse modelo o normalizador exercerá um papel mais relevante do que no atual sistema regulatório, na medida em que a normalização constituirá o palco principal de discussões sobre requisitos técnicos específicos dos objetos regulados. Isso demanda, entre outras coisas, uma relação mais próxima do regulador com o normalizador. No âmbito da União Europeia, inclusive, a normalização é regulamentada pelo Regulamento (UE) nº 1.025/2012, com regras de transparência e participação de interessados, acesso a micro e pequenas empresas, entre outras.

O Inmetro ainda não elaborou uma proposta de regulamentação para atividade de normalização (tal como a existente na UE), mas acha que essa atividade assume um papel importante no novo modelo e, em função disso, deve ser objeto de discussão mais aprofundada posteriormente com a ABNT e, possivelmente, no âmbito do Conmetro, que é o fórum que estabelece as diretrizes para a atividade de normalização no país.

Enfim, utópico ou distópico, o Inmetro garante que, para que não ocorram falhas no processo de regulamentação e na prevenção de crises, está tomando algumas medidas. Todos os novos regulamentos serão elaborados seguindo os princípios da participação e da transparência, sendo construídos em comissões técnicas com ampla participação das partes impactadas.

Todos os regulamentos serão ainda precedidos de Estudos de Análise de Impacto Regulatório (AIR) – processo sistemático de análise baseado em evidências que busca avaliar, a partir da definição de um problema regulatório, os possíveis impactos das alternativas de ação disponíveis para o alcance dos objetivos pretendidos, tendo como finalidade orientar e subsidiar a tomada de decisão. Os novos regulamentos, após a sua implantação serão monitorados por meio de Estudos de Avaliação de Resultado Regulatório (ARR): instrumento de avaliação do desempenho do ato normativo adotado ou alterado, considerando o atingimento dos objetivos e resultados originalmente pretendidos, bem como demais impactos observados sobre o mercado e a sociedade, em decorrência de sua implementação. A conferir.

Fonte: Hayrton Rodrigues do Prado Filho - Revista Adnormas, em 08/10/2019